O papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na privatização do saneamento básico tem gerado indignação entre trabalhadores, dirigentes sindicais do setor e entidades que defendem o direito à água. Em reunião realizada no último dia 12 de dezembro, na sede do banco no Rio de Janeiro, representantes da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU), do Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (ONDAS) e de sindicatos estaduais expressaram seu repúdio à atuação do BNDES em modelar e financiar a entrega de empresas públicas para a iniciativa privada.
Na reunião com a superintendente de Estruturação de Projetos do BNDES, Luciane Machado, os representantes sindicais denunciaram o banco por incentivar a formação de um oligopólio privado, concentrando serviços essenciais nas mãos de poucas empresas. O questionamento feito é que o BNDES, ao invés de cumprir sua função social e financiar a reestruturação das empresas públicas, tem se transformado em um instrumento para ampliar a privatização no setor de saneamento, o que é inaceitável.
Na avaliação dos dirigentes urbanitários, apesar do BNDES carregar em seu nome o compromisso com o “desenvolvimento social”, ele tem se distanciado dessa missão, deixando de ser um banco social para se tornar um facilitador da privatização do patrimônio público. “O banco tem ignorado alternativas para fortalecer o setor público e, ao contrário, atua como peça-chave na execução de uma política neoliberal que compromete o acesso universal à água e ao esgoto”, avalia Pedro Damásio, presidente da FNU.
O banco “lava as mãos” diante da privatização
A representante do banco argumentou que a privatização do setor segue demandas dos governadores e prefeitos, que buscam modelagens para concessões, parcerias público-privadas (PPP) e outras formas de transferência de serviços à iniciativa privada. Luciane Machado ainda afirmou que as empresas públicas enfrentam dificuldades para acessar financiamento devido a restrições impostas por resoluções do Conselho Monetário Nacional (CMN), o que inviabiliza sua reestruturação.
Essa justificativa foi veementemente contestada pelos dirigentes das entidades presentes ao encontro, apontando que tais limitações foram fruto de decisões políticas tomadas desde o governo Michel Temer, aprofundadas por Jair Bolsonaro e, lamentavelmente, mantidas no governo Lula. “Estamos vendo o governo federal referendar uma política que entrega o patrimônio público brasileiro, com o BNDES como instrumento de privatização”, enfatizou Fábio Giori, secretário de saneamento da FNU.
Impactos alarmantes
O processo de privatização do saneamento básico, além de entregar serviços essenciais à iniciativa privada, ameaça a universalização do acesso à água e ao esgoto, como prevê o marco regulatório do setor. Estudos apresentados pelos dirigentes sindicais reforçam que a privatização não traz benefícios diretos à população e que a reestruturação financeira e administrativa das companhias públicas é o caminho mais eficiente e justo.
Entre os casos alarmantes discutidos na reunião está a proposta de privatização da Copasa (MG) e a PPP que prevê a entrega dos serviços de água e esgoto nos vales do Jequitinhonha e Mucuri, em Minas Gerais. Para Eduardo Pereira, presidente do Sindiágua-MG, “há alternativas concretas para fortalecer as empresas públicas, mas a escolha política tem sido pela privatização, em detrimento da qualidade dos serviços e da garantia de acesso para todos”.
Proposta para um debate mais amplo
Ao final da reunião, os dirigentes fizeram uma provocação importante: propuseram que o BNDES, como um agente político e econômico de relevância, lidere discussões para identificar as barreiras que dificultam o financiamento público no setor de saneamento. “É muito fácil para o banco lavar as mãos e culpar o Congresso ou o Conselho Monetário Nacional pelas limitações existentes. Propusemos que o BNDES tome a iniciativa de realizar seminários, audiências e plenárias para debater onde estão as amarras para o financiamento público e como podemos desburocratizar o acesso das empresas públicas aos recursos do banco,” explicou Lucas Tonaco, dirigente do Sindiágua-MG e da FNU
A proposta foi bem recebida pela superintendente Luciane Machado, que afirmou ter apreciado a sugestão e reconheceu a importância de avançar nesse debate. Segundo ela, o banco avaliará formas de colocar em prática essas discussões e buscar soluções para fortalecer as empresas públicas e seu papel no desenvolvimento social.
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